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Secção dos Deuses

Egon

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Sep 19, 2017
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Karnonnos [Guardião Templar]:

Saudações a todos. Publicarei toda a secção atualizada sobre Deuses e Daemons neste tópico, incluindo os Rituais dos Deuses mais antigos, lançados antes da minha tarefa, e artigos atualizados com novas informações [como as cartas de Tarô para Khnum, Asclépio, Forcas, etc.]. O título aqui será atualizado a cada nova adição.

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Maat é a Deusa egípcia da ordem, lei, harmonia, equilíbrio e da verdade. Era uma das divindades mais importantes do panteão egípcio e possuía um simbolismo de longo alcance, evocado em todos os cantos da sociedade da grande civilização do Nilo. Era considerada uma representante divina do sistema jurídico no seu todo, mas também a dispositora das estações do ano, dos movimentos dos astros e de outros aspectos gravados na própria natureza.

No cerne da lei egípcia estava Maat, o termo multifacetado que abrange a justiça, a verdade, a ordem e o equilíbrio. Maat não era meramente um ideal ético, mas um princípio divino que assegurava o funcionamento do universo. Dizia-se que os faraós "faziam Maat" e "viviam de Maat", e a Deusa com este nome aparece em relevos de templos, inscrições em túmulos e contextos legais como um símbolo vivo de tudo o que abrangia.

[Maat] era o princípio da ordem correta pelo qual os Deuses viviam e que os homens reconheciam como necessário na Terra e incumbência deles.
— M. Lichtheim

De acordo com a cosmologia egípcia, a Deusa Maat existia desde o início dos tempos, estabelecida pelo Deus Criador (Atum, ou mais frequentemente Re) para garantir o funcionamento harmonioso do universo. Ela representava a ordem natural que mantinha o caos (izfet) sob controlo. No mito heliopolita da criação, Enéade, Maat estava implicitamente presente como o princípio que estruturou o mundo após o caos primordial de Nun.

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Maat estava intimamente ligada ao Deus Sol Re e era frequentemente descrita como Sua filha. Ela acompanhava Re na Sua barca solar enquanto esta viajava pelo céu e pelo submundo, protegendo-O da serpente do caos Apófis. Sua função como guardiã de toda a ordem moral era destacada neste papel, e as representações raméssidas mostram frequentemente o Deus Solar a segurar a pena da Sua filha.

A ideia evocava a ordem cósmica de uma forma mais abstrata. Aos olhos egípcios, Maat controlava os mecanismos das mudanças sazonais, o movimento dos astros e as condições do ar. A teologia do Império Novo apresentou Maat como o princípio ordenador que acompanhava o Sol, daí a sua pequena mas essencial figura nos barcos do submundo.

Maat era uma das Deusas mais visíveis nas cerimónias públicas. A sua iconografia tornou-se proeminente na era subsequente a Horemheb e atingiu o auge da sua fama durante os faraós raméssidas, quando o Egipto recuperava das políticas ímpias de Akhenaton. A sua imagem manteve-se adaptável ao longo da evolução da civilização egípcia.

Talvez sem surpresa, as cenas em que é retratada ocorrem frequentemente em contextos reais, como o Templo de Seti I e a corte de Tutmés I. A iconografia do Império Novo, utilizando o seu simbolismo para reforçar a ordem, é flagrante e claramente intencional. A ampliação do Templo de Karnak por Ramsés III exibe a Deusa em muitas cenas frontais na Primeira Corte. Além disso, os túmulos de Merneptah, Seti I, Twosret, Ramsés III, Ramsés IV, Ramsés VI, Ramsés VII, Ramsés IX e Shoshenq III apresentam a sua iconografia.

Um aspceto sutil de Maat era a relativa passividade e reverência da Deusa em relação à ordem a que presidia. Maat estava representada na cerimónia da Pesagem do Coração. Era também frequentemente retratada a ligar os Deuses ou o Faraó com o receptor de um ritual. No Amduat e no Livro dos Portões, pintados nas paredes dos túmulos reais, uma pequena Maat, de pé ou sentada, cavalga na proa ou caminha à frente do barco de Re, garantindo a ordem cósmica mesmo na viagem nocturna.

Maat, juntamente com Thoth e Seshat, foi nomeada uma das principais divindades dos escribas (sesh) no Egipto.

Em questões quotidianas, o Egipto era governado por costumes legalistas. Os escribas eram fundamentais. Os aspectos menores da lei, para além da lei capital e da lei do Faraó, não eram idênticos aos sistemas jurídicos modernos. Os litígios a nível local seriam resolvidos em arbitragem com base nas circunstâncias dos indivíduos envolvidos. Os tribunais superiores, com códigos de leis centrais ou capitais supervisionados pelo vizir, poderiam ser recorridos se a decisão destas arbitragens menores não fosse satisfatória para o autor.

A lei era meticulosamente transcrita na burocracia egípcia muito antes de os escribas da China e das primeiras sociedades modernas da Europa começarem a fazê-lo. Milhares de documentos legais sobrevivem, muitos da aldeia de Deir el-Medina, onde os trabalhadores mantinham contratos detalhados e registos de julgamentos; o Papiro Wilbour, que faria o inventário das terras e obrigações fiscais; os Papiros Abbott e Amherst, detalhando investigações de roubos de túmulos; para além de vários documentos de casamento, divórcio e adoção do Período Tardio e da era ptolemaica.

Os escribas garantiam também que não ocoressem abusos de poder e tornaram-se importantes intermediários entre as classes que comunicavam com os tribunais centrais de justiça. Num certo sentido, o escriba e a palavra escrita tornaram-se a "cola" entre as diferentes classes do Egipto.

A equiparação da Deusa da Justiça ao sistema jurídico era de tal ordem que o mais alto juiz secular do Egipto era o Vizir, formalmente nomeado como o Sacerdote de Maat.

Os juízes eram também adornados com a pena de avestruz. O juiz do Supremo Tribunal era o próprio Faraó, que também jurava defender Maat, mas delegava a responsabilidade.

Na sua Biblioteca de História (Livro I), Diodoro Sículo ofereceu uma descrição elaborada das práticas judiciais egípcias, tal como existiam no período romano. Escreveu que, antes do início de uma sessão do tribunal, o juiz principal colocava uma corrente de ouro da qual pendia uma pequena figura feita de pedra preciosa, chamada Verdade. Os julgamentos só começavam quando o juiz vestia este emblema da Deusa, significando que a justiça só deveria ser administrada na presença do poder de Maat.

ἐφόρει δ᾿ οὗτος περὶ τὸν τράχηλον ἐκ χρυσῆς ἁλύσεως ἠρτημένον ζῴδιον τῶν πολυτελῶν λίθων, ὃ προσηγόρευον Ἀλήθειαν. τῶν δ᾿ ἀμφισβητήσεων ἤρχοντο ἐπειδὰν τὴν τῆς Ἀληθείας εἰκόνα ὁ ἀρχιδικαστὴς πρόσθοιτο. τῶν δὲ πάντων νόμων ἐν βιβλίοις ὀκτὼ γεγραμμένων…

ἀμφοτέρων δὲ τῶν ἀντιδίκων τὰ γεγραμμένα δὶς τοῖς δικασταῖς δόντων, τὸ τηνικαῦτ᾿ ἔδει τοὺς μὲν τριάκοντα τὰς γνώμας ἐν ἀλλήλοις ἀποφαίνεσθαι, τὸν ἀρχιδικαστὴν δὲ τὸ ζῴδιον τῆς Ἀληθείας A história do Juiz Presidente.


O [Presidente do Supremo Tribunal] usava regularmente, suspensa ao pescoço por uma corrente de ouro, uma pequena imagem feita de pedras preciosas, a que chamavam Verdade (Maat); as audições dos argumentos começavam sempre que o presidente do Supremo Tribunal colocava a imagem da Verdade. Todo o corpo das leis estava escrito em oito volumes, que se encontravam diante dos juízes...

E quando ambos os litigantes prestavam declarações escritas aos juízes em duplicado, era então exigido que os Trinta declarassem as suas opiniões entre si, e que o presidente do Supremo Tribunal acrescentasse a imagem da Verdade a um dos dois lados da disputa.
— Capítulo 75, Livro 1, Biblioteca Histórica, Diodoro Sículo

SIMBOLISMO DE MAAT

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Maat é tipicamente retratada como uma jovem idealizada usando uma única pena de avestruz afixada numa faixa na cabeça. Representações em túmulos mostram-na com a pena na mão, atuando como emissária da justiça. Outras Deusas, como Ísis ou Néftis, também podem ser retratadas a segurar a pena.

Um dos principais simbolismos da pena diz respeito à projeção astral e à leveza do Chakra Mediano, juntamente com a leveza da alma após a saída do corpo físico. A Deusa é uma das principais regentes desta parte da alma; seus poderes são pouco compreendidos.

A pena evoca a leveza e a graça da Verdade. Por ser tão leve, pode ser empurrada para qualquer lugar e em qualquer lugar. Ela aponta também para a pena de pelicano de Thoth. O conhecimento é um dos muitos braços da Verdade. Tanto Maat como Shu eram simbolizados apenas pela pena, e o nome para esta em egípcio era "shut".

O homem que faz justiça a todos foi representado pela pena de avestruz; porque esta ave, ao contrário das outras, tem todas as suas penas iguais.
—Hieroglyphica, Horapollo

Tal como na língua inglesa, onde surgiu uma curiosa convergência da palavra para “light” tanto no peso leve como na propriedade da iluminação, também as duas ideias partilhavam um simbolismo sobreposto no mistério egípcio. Maat era vista como uma Deusa do prisma de luz que dissipava representativamente todas as trevas e ignorância.

Sendo um símbolo de ressurreição, os ovos de avestruz foram descobertos em túmulos do antigo Egipto e da Núbia como uma espécie de oferenda funerária. Acreditava-se que as cascas dos ovos de avestruz serviam de alimento para os mortos e, por isso, simbolizavam a ressurreição e a vida eterna — uma crença que continuava a ser encontrada nos túmulos muçulmanos.
Ostrich Egg and its Symbolic Meaning in the Ancient Egyptian Monastery Churches, Dra. Sara El Sayed Kitat

Frequentemente, ela é retratada com duas asas, de forma semelhante a Ísis.

As cenas do faraó a oferecer uma pequena estatueta de Maat a outros Deuses são extremamente comuns, proliferando em imagens sacras até ao final do período romano. Este tipo de simbolismo sugeria que o governante do Egipto demonstrava que mantinha vivas no seu reino a Verdade e a manutenção das Leis.

Maat é frequentemente equiparada a Tefnut em aspecto, que representa o princípio criativo na formação do mundo. É retratada desta forma como irmã de Shu, um Deus intimamente relacionado com Maat e Anúbis. Na sua forma regular, é considerada a mãe de Seshat. É simbolicamente representada como a esposa de Thoth, embora isso não seja verdade para a própria Deusa.

MAAT COMO UM CONCEITO

Maat como conceito era considerado o motor da civilização egípcia, e a razão para a existência da civilização nos textos egípcios era promover um mundo de Maat continuamente refinado e em evolução que impulsionasse os indivíduos para o Divino, em comparação com a brutalidade da natureza inferior.

Consequentemente, o mecanismo de Maat incorporava um alinhamento crescente com os Deuses para aqueles que eram escolhidos para o fazer.

A cerimónia da Pesagem do Coração era a peça central do papel de Maat na compreensão egípcia. No Ritual, o coração (ib) do indivíduo a julgar era colocado num prato da balança, com a pena de Maat a ocupar o outro. Osíris era tipicamente retratado como o árbitro final do processo. Os Deuses típicos envolvidos na avaliação do processo eram a própria Maat, Anúbis e Thoth, mas também Seshat, Meshqenet e outros. Se o coração fosse mais pesado que a pena, era lançado à besta devoradora Ammit.

Maat era frequentemente representada num papel duplo, e a câmara da Pesagem dos Corações era frequentemente chamada de “Câmara das Duas Deusas”. As razões para tal tornam-se mais óbvias ao examinarmos a forma como Maat era vista na civilização helénica. Era também acompanhada por 42 Juízes e divindades menores.

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Como se compreende, um aspecto de Maat, como a pena e a lei, exemplificava a leveza de uma alma não adulterada versus a sujeira, os pecados e as transgressões morais de um indivíduo. A tristeza do coração estava ligada ao testemunho de certas verdades relacionadas com estas áreas da vida, que os Deuses podiam sempre ouvir. O duplo caminho aqui era semelhante aos costumes gregos da vida após a morte, como o Tártaro e os Campos Elísios.

Atos abomináveis, ignorância insondável, excessos autodestruidores e maldade podiam tornar o coração pesado para além de qualquer redenção. Um caminho de pura destruição sem utilizar o princípio da criação era o método mais fácil para acabar nas garras de Ammit. Nisto se reflecte a estreita associação de Maat com Ísis (Afrodite), particularmente a virtude do Equilíbrio.

Os textos egípcios e os manuais de instrução associados à Deusa alertam repetidamente, desde o início, contra o uso do medo e da violência excessiva para controlar outros crentes. Isto é explicitamente citado como um abuso de Maat, que tornará ignorantes aqueles que estão submetidos a tal regime, pondo em risco a sua própria alma, mas também a dos outros. A disseminação do medo e da ignorância sem justa causa foi outra grande transgressão.

Num sentido oculto no caminho Zevista, com a purificação espiritual, a pessoa torna-se cada vez mais leve. A energia começa a atingir a Coroa quando os Chakras se abrem e fluem sem obstruções. A sensação de estar preso, amarrado e sobrecarregado dissipa-se completamente. A facilidade total para operar magia torna-se alcançável. A sensação de leveza simboliza a capacidade de atravessar tudo com facilidade e pode ser considerada o oposto de estar preso ou amaldiçoado.

Aquele que dominou e transformou sua alma será, à vontade, leve como uma pena.
—O Tarô e a Transformação Espiritual, Suma Sacerdotisa Maxine Dietrich.

No entanto, um aspecto de Maat que é mal compreendido é um conjunto específico de significados relacionados com a autoprogressão e a apoteose (tornar-se um Deus). Estes significados foram manchados, dado que muitos egiptólogos cruzaram referências à Pesagem do Coração com passagens que fazem referência a simbolismos semelhantes na Bíblia — aí distorcidas para terem um significado nitidamente vulgar e desprezível. Maat é também equiparada à compreensão arruinada e limitada de “karma” do hinduísmo moderno, budismo e os movimentos da Nova Era.

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O coração não era apenas indicativo do seu peso em relação aos pecados, mas também da integridade do órgão em expressar a própria individualidade e em manter a alma viva o suficiente para desejar a encarnação adequada. Na cultura moderna, tal conceito pode ser transmitido sucintamente em frases genéricas como “seguir o coração”.

Um indivíduo cujos caprichos são completamente controlados por outros, cuja viagem inteira pela vida consiste em cobardia perante a malignidade e que, além disso, põe em risco o curso da lei por não fazer nada, também poderia ser considerado um indivíduo atolado em izfet e apto a ser devorado por Ammit — independentemente de como possamos encarar isso agora.

Textos instrutivos associados à Deusa, como “O Camponês Eloquente”, demonstravam a forma correta de agir e não permitir que os insultos ou injustiças passassem despercebidos. A reparação adequada era vista como uma importante iniciativa individual.

Um indivíduo totalmente passivo poderia ser comparado ao microcosmo de uma civilização que cometeu um erro grave e se tornou sem lei por não utilizar as armas da natureza para proteger o que é valioso. Cada pessoa tinha o dever de defender Maat, não só tentando abster-se de cometer injustiça, mas também não se submetendo a ela sem questionamento.

Eis uma distinção muito importante a fazer entre a religião egípcia e a interminável martirologia do cristianismo e de outros credos escravagistas.

O cristianismo prega a passividade e a condenação sem fim. Os fiascos e os perdedores naturais na vida sempre foram o cristão perfeito, e os principais representantes das nossas civilizações contemporâneas também pregam compulsivamente a autoproclamada vitimização como o ideal mais elevado, enquanto o uso da justiça para proteger os verdadeiramente inocentes é “pregado à parede”, criando uma situação em que as queixas genuínas se podem misturar com ressentimento e mesquinhez — ao ponto de muitas pessoas serem separadas por forças opostas. O caos surgiu como resultado.

“Quando te deitares, guarda o teu coração, pois ninguém terá adeptos no dia da adversidade.”
—Instrução do Faraó Amenemhat I

“Não te deixes chamar ‘idiota’ por causa do silêncio na hora de falar.”

...

“Há quem viva com pouco a fim de poupar, e mesmo assim fica pobre.”
—Papiro Insinger, da Late Egyptian Wisdom Literature in the International Context, M. Lichtheim.

No entanto, isto não se referia apenas a este tipo de indivíduos, mas também àqueles que viviam vidas encantadoras e agradáveis, cheias de distrações, como uma vida vivida sem prejudicar ninguém, mas, em certo sentido, sem fazer nada pelos Deuses, nem por si mesmos. Mesmo esta constituía uma espécie de existência errónea, se não fosse submetida a testes filosóficos e práticos das margens da vida.

Mais importante ainda — para além dos indivíduos iludidos e malignos do inimigo — isto também se aplica aos ascetas do hinduísmo, do taoísmo e de outras religiões que ensinam o desapego à vida, procurando apenas a adesão total à espiritualidade escravagista, sem qualquer motor para estimular o desenvolvimento. Os próprios Deuses reprimiram os poucos que conseguiram atingir níveis avançados, enquanto pregavam o ódio total à vida. O Egipto não adoptou, enfaticamente, a abordagem do ódio à vida para o desenvolvimento espiritual; a Terra Negra era uma civilização da vida.

Nele existe também um código relativo ao Chakra Mediano, para além dos dois signos de Vénus e das Casas mundanas associadas, particularmente a 7ª Casa. Permitir a entrada a “qualquer um” é ter o coração dilacerado por dezenas de mãos gananciosas e lascivas; mas não permitir a entrada de ninguém é encher o coração de arrependimento e deixá-lo apodrecer. Ambos os corações, se tomados por excesso e privação, podem ser devorados por Ammit ou lançados no Lago do Fogo.

“O grande Deus chamado Thoth estabeleceu uma balança para que a Terra fosse medida com justiça.

Colocou o coração oculto na carne para a medida correta do seu dono.

Se um sábio não for equilibrado, a sua sabedoria não terá qualquer valor.

Não se descobre o coração de um sábio se não o tivermos testado em determinada questão.”
—Papiro Insinger, da Late Egyptian Wisdom Literature in the International Context, M. Lichtheim.

Em todos estes casos, o coração torna-se leve. Como poderia ser, quando se é uma bigorna pesada e em queda livre pela vida?

A verdade é que fazer voar o coração implica trabalho árduo, ativando aspectos do eu em desenvolvimento. Não existem atalhos fáceis para tal processo. Parte desta ênfase no autodesenvolvimento para defender o princípio da Verdade é a razão pela qual Maat tem Marte como planeta regente, o que pode parecer inusitado para aqueles que estão familiarizados com a Astrologia. Os Deuses indicaram-me passagens de Assim Falou Zaratustra sobre este assunto:

Criar — eis a grande salvação do sofrimento e o alívio da vida. Mas para que o criador apareça, sofrimento em si é necessário, e muita transformação.

Sim, muita morte amarga deve haver nas vossas vidas, criadores! Assim, sois defensores

e justificadores de toda a perecibilidade.

Para que o próprio criador seja o recém-nascido, deve também estar disposto a ser o progenitor da criança e a suportar as dores do progenitor.
—Assim Falou Zaratustra, Nietzsche

Eis também o código para o simbolismo do Três de Copas de Maat, carta que ela partilha com o litigante da Pesagem do Coração, Anúbis.

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A carta retrata três mulheres vestidas com túnicas a erguer três taças para o céu em celebração, rodeadas de plantas abundantes. Esta carta transmite tipicamente conclusões que envolvem amizades, associações e celebrações que podem impulsionar um indivíduo para o próximo nível do seu desenvolvimento. Ela diz aos indivíduos para estarem atentos a tais festividades e para não se deixarem sobrecarregar, mas também para não se afastarem delas.

No simbolismo visual do Três de Copas do baralho Rider-Waite, existe um código oculto para os três granthis, ou os nós da alma, que fluem desobstruídos para permitir o fluxo de energia através dos Chakras — uma área dos poderes de Maat que é abordada acima. Esta é uma das razões pelas quais a carta era também conhecida como “Alívio” (Soumisement) na época de Etteilla.

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Não admira que a carta simbólica dos Arcanos Maiores de Maat seja a carta Justiça virada para cima. A balança e a espada são seguradas por uma mulher coroada e vestida com um manto, sentada num trono entre dois pilares. A cor vermelho-sangue das suas vestes e a cortina entre os pilares representam o planeta regente de Maat.

O seu olhar é absoluto e sereno. A carta para cima da Justiça mostra que todas as ações têm consequências e, se algo de errado foi cometido, tu ou alguém que te prejudicou será responsabilizado. De uma forma mais discreta, refere-se normalmente a uma questão em que falar a verdade é uma necessidade ou onde a verdade é revelada. A carta da Justiça indica, por vezes, que será tomada a decisão mais justa.

A Justiça pode também aparecer de forma geral ao consulente para descrever determinadas ativações e desafios da sua missão de vida. A balança e a espada indicam que pode estar num processo de avaliação ou teste para alcançar o próximo nível. Pode também significar que terá de escolher entre duas questões urgentes que podem ter consequências, independentemente da sua intenção.

Por vezes, a Justiça pode simplesmente aparecer para lembrar o consulente de não ser excessivamente exigente se ele tiver feito pouco para o justificar.

MAAT NO CONTEXTO INIMIGO

Sabe-se também que o falsário Akhenaton distorceu o conceito de Maat para punir os seus inimigos e formular uma ideologia escravagista. É por isso que Horemheb e os seus sucessores aplicaram penas extremas para a distorção do conceito.

Numerosas convenções hebraicas existiram para roubar a ideia da balança desde um ponto inicial, como a literatura Midrash como o Kohelet Rabbah. A literatura judaica liga o julgamento de Maat com o Rosh haShanah.

O Zohar descreve a “Câmara de Mérito”, guardada por anjos encarregados da “balança da justiça”, com méritos a puxar para o prato da direita, pecadores para a esquerda, e presidida por ‘Mozniya’ — uma cópia fajuta mal formulada. O chefe da balança hebraica tem também dois presidentes em emulação de Maat. Esta passagem menciona também a presença de Rá, Thoth e Maat no “lado mau”, que “seduzem o mundo” e julgam aqueles que “se tornam impuros”.

Tais mecanismos tentam impedir que os religiosos hebreus sejam julgados da mesma forma que a “imundície” da Terra — os povos não-judeus.

MAAT NO CRISTIANISMO

Com o advento do cristianismo, as referências explícitas a Maat pelo nome praticamente desaparecem dos textos sobreviventes, pois adoração direta à Deusa teve fim. No entanto, um número intrigante de escritos coptas adapta ou ecoa temas que eram proeminentes no culto de Maat, especialmente no que diz respeito ao julgamento após a morte, o que também se assemelha ao conceito emergente na literatura rabínica.

Um dos mais ilustrativos é o Apocalipse Copta de Paulo (parte da biblioteca de Nag Hammadi, século IV d.C.), onde o apóstolo Paulo vive uma ascensão visionária e, a dada altura, se depara com uma pesagem de almas. Neste texto, as almas dos mortos são pesadas em balanças por uma figura divina para determinar a sua retidão — um claro paralelo à antiga “pesagem do coração” diante de Maat, inserida numa estrutura gnóstica cristã.

Outro exemplo encontra-se na lenda posterior de um santo copta, A História de Butrus, o Asceta, preservada num sinaxário árabe-copta (era medieval). Nesta história, o avarento Butrus tem um sonho sobre o seu julgamento pessoal, semelhante ao medo judaico do “outro lado”:

Butrus viu uma balança erguida e uma multidão de seres negros e feios a carregarem os seus pecados e injustiças para colocar no prato esquerdo da balança, e uma hoste de anjos brilhantes a colocar todas as boas ações no prato direito.
—A História de Butrus o Asceta, Sinaxário Árabe Jacobita.

Boécio, autor romano tardio e apologista cristão, escreveu uma obra intitulada A Consolação, que se baseava em determinados temas que explicavam a natureza da ordem e tentava hibridizar temas platónicos com a Igreja Católica a que servia. Esta obra representava um diálogo imaginário em que a Filosofia, personificada como uma mulher (conhecida como Senhora Sabedoria), defende que, apesar da aparente desigualdade do mundo, existe um poder superior e todo o resto é secundário a esta Providência divina.

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Cena de Consolação da Filosofia, de Boécio, Escola Francesa (séc. XV)

Era típico representar a Senhora Sabedoria nas convenções estilísticas medievais como possuidora de duas penas ou asas, retiradas das histórias de Boécio. Infelizmente, a popularidade desta obra desencadeou muitas das principais tentativas do cristianismo para se apropriar da virtude e sabedoria helénicas.

Através da demonologia inimiga na Europa medieval, Maat foi reformulado como o Demónio chamado Morax, alternativamente chamado Foraii ou Marax, aparecendo ao mago como um touro que ocasionalmente assume a face de um homem ao dar conselhos aos sábios:

Morax, também conhecido por Foraii, um grande conde e presidente, é visto como um touro, e se toma para si o rosto de um homem, torna os homens extraordinariamente astutos em astronomia, em todas as ciências liberais: dá bons familiares e sábios, conhecendo o poder e a virtude das pedras e ervas que são preciosos, e governa trinta e seis legiões.
—Pseudomonarchia Daemonum, Johann Weyer

As ciências liberais representam também uma espécie de código relacionado com as funções de Maat. Em primeiro lugar, todas as artes liberais representam um desejo de compreensão universal baseada na ordem universal. Na Europa medieval, o estudo de tais assuntos significava o estatuto de homem livre, do qual se esperava que compreendesse as virtudes e os códigos da sociedade em que vivia — daí o termo liberalis, que significa “o que se espera de um homem livre”.

Sete artes liberais — música, aritmética, geometria, astronomia, retórica, gramática e lógica — existiram, refletindo a primazia do número sete como veículo do karma e a sua ligação central com a própria Maat. Estas artes, particularmente o trivium dos escribas, eram centrais no estudo do direito. Enquanto Maat permaneceu demonizada em grimórios ou referenciada alegremente como a “Senhora Sabedoria” nas convenções medievais, tais artes foram ridiculamente creditadas como pertencentes ao excremento “virgem Maria”:

Está escrito: “A Sabedoria construiu para si uma casa, lavrou para si sete colunas” (Provérbios 9:1). Esta casa é a Santíssima Virgem; as sete colunas são as sete artes liberais.
—Mariale in Evangelium, Alberto de Colónia.

O código para conhecer a astronomia, por si só, relaciona-se com as propriedades sazonais de Maat.

MAAT NO ISLAMISMO

No islamismo, o termo principal para a “balança” utilizada para pesar os actos humanos no Dia da Ressurreição é al-Mizan, que foi descaradamente copiado da religião egípcia e nem sequer escondido, ao contrário do judaísmo ou do cristianismo. Isto é explicitamente mencionado várias vezes no alcorão:

وَنَضَعُ ٱلْمَوَازِينَ ٱلْقِسْطَ لِيَوْمِ ٱلْقِيَٰمَةِ فَلَا تُظْلَمُ نَفْسٌ شَيْـًٔا ۖ وَإِن كَانَ مِثْقَالَ حَبَّةٍۢ مِّنْ خَرْدَلٍ أَتَيْنَا بِهَا ۗ وَكَفَىٰ بِنَا حَٰسِبِينَ

Estabeleceremos uma balança de justiça para o Dia da Ressurreição, para que nenhuma alma seja tratada injustamente no mínimo. E se houver pelo menos o peso de um grão de mostarda, nós produzi-lo-emos. Fazemos excelente conta.
—Ǫur'an 21:47

وَٱلسَّمَآءَ رَفَعَهَا وَوَضَعَ ٱلْمِيزَانَ أَلَّا تَطْغَوْا۟ فِى ٱلْمِيزَانِ ﴿٨﴾ وَأَقِيمُوا۟ ٱلْوَزْنَ بِٱلْقِسْطِ وَلَا تُخْسِرُوا۟ ٱلْمِيزَانَ

E ele levantou os céus e pôs a balança (al-mizan), para que não transgredisseis na balança. Estabelecei o peso com justiça e não defraudeis a balança.
—Ǫur’an 55:7–9

Os comentadores muçulmanos também tinham grande conhecimento da presença de Maat entre as Deusas pagãs. Eles escreveram:

“Eles (os antigos juízes do Egipto) costumavam usar, pendurada ao pescoço, uma pequena figura dourada de uma mulher segurando uma balança e uma pena, para que todos os que a vissem soubessem que ela pesava os seus actos com Verdade.”
—al-Khitat, Al-Maqrizi

O historiador do século IX Ibn Abd al-Hakam, na sua Conquista do Egipto, relata uma história possivelmente apócrifa: quando o califa Umar recebeu o tesouro do faraó, entre eles foi encontrado um ídolo ou gravura de uma mulher com uma espada numa mão e uma balança na outra, que os conselheiros de Umar interpretaram como uma representação da Justiça.

BIBLIOGRAFIA


Instruction of Pharaoh Amenemhat I

The Library of History, Diodorus Siculus

Sobre Ísis e Osíris, Plutarco

Hieroglyphica, Horapollo

Mariale in Evangelium, Albert of Cologne

Al‑Khitat, Al-Maqrizi

Assim Falou Zarathustra, Friedrich Nietzsche

Maat: The Moral Ideal in Ancient Egypt, Mowlana Karenga

Insinger Papyrus, from Late Egyptian Wisdom Literature in the International Context, M. Lichtheim

The story of Butrus the Ascetic, Jacobite Arab Synaxarium

Ancient Records of Egypt: The Eighteenth Dynasty, James Henry Breasted

Ostrich Egg and its Symbolic Meaning in the Ancient Egyptian Monastery Churches, Dr. Sara El Sayed Kitat

"The ancient Egyptian concept of Maat: Reflections on social justice and natural order", R.J. Ferguson

CRÉDITOS:

Karnonnos [Guardião Templar] (texto)
Power of Justice [Guardião Templar] (edição estilística, gramática e sintáxe)
 

Al Jilwah: Chapter IV

"It is my desire that all my followers unite in a bond of unity, lest those who are without prevail against them." - Shaitan

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